1845: Uma vista do rio Doce, no Brasil

 

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Descrição

A litografia intitulada “Uma vista do rio Doce, no Brasil” representa uma cena do século XIX na região do rio Doce, importante curso fluvial que atravessa os atuais estados de Minas Gerais e Espírito Santo, desaguando no litoral capixaba. Produzida em 1845 pelo artista C. Legrand, a imagem integra o conjunto de representações visuais de viajantes e artistas europeus que registraram paisagens brasileiras durante o oitocentos.

Na composição, observa-se um grupo de homens em uma grande embarcação, conduzida ao longo do rio em meio à densa vegetação tropical. O artista enfatiza a exuberância da floresta, retratando palmeiras, árvores frondosas e plantas de grande porte, que sugerem tanto a fertilidade natural da região quanto uma ideia de exotismo típica das representações europeias sobre os trópicos.

As figuras humanas desempenham papel importante na leitura histórica da cena. Grande parte dos tripulantes aparece vestida de branco, com roupas simples, o que sugere tratar-se de homens negros, provavelmente escravizados, empregados na navegação e no transporte. Entre eles destacam-se algumas figuras com trajes mais elaborados, chapéus e postura distinta, que podem ser interpretadas como representantes da camada senhorial ou de viajantes europeus, reforçando a hierarquia social da época. Essa diferenciação de vestimentas e posições na embarcação reflete visualmente as desigualdades raciais e sociais que estruturavam a sociedade escravista brasileira no século XIX.

Assim, a obra não apenas documenta a paisagem natural do rio Doce, mas também registra, ainda que de modo indireto, a presença central do trabalho escravizado na ocupação e exploração das regiões fluviais do Espírito Santo e suas conexões com o interior. Ao mesmo tempo em que projeta para o público europeu uma imagem de exuberância natural e exotismo, a litografia testemunha, em suas entrelinhas visuais, a violência estrutural da escravidão que sustentava a vida econômica e social da região.