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27/07/1682: Imformação que dou a V. S. do estado em que fica esta capitania no breve tempo que nel la assistio
Já dey a V. S. relação do miseravel estado em que estava a fortificação desta praça quando Deus o trouxe a ella, hé bem que o torne a fazer do que a deixa no breve tempo em que nella assistio e não o farey só do que toca á fortificação, mas tambem do muito que fica augmentada.
Estava o Forte Nossa Senhora do Monte do Carmo, sómente em alicerces e muita parte arruinada. Com grande dispendio o aprefeiçoou V. S. acabando e abrindo lhe amêas para catorze peças com fortissima muralha de nove palmos de groço e oito de alto e tem húa fermoza praça em sy, cuja largura hé de 183 palmos e da porta athé a ultima ponta de diamente 120, lageada o necessario com dois telheiros para o resguardo da artilharia e fica ao presente com cuatro peças e cuatro pedreiros com suas carretas novas e o mais necessario. O Forte S. Joam que edificou o capitão João Ferrão de Castello Branco o achou V. S., tão arruinado que não estava capax de poder resistir a qualquer invazão, porque alem da ruina, estava a artilharia sem reparos; entre a plataforma que tinha e o primeiro fortim, fazia húa rua inutil.
Redificou o V. S. fortessimamente unindo a em hum só terrapleno, abrindo lhe mais torneiras pela parte do mar na muralha que acrescentou; e pela parte da villa vay fechar o mesmo fortim em altura que cobre a escada que V. S. lhe mandou fazer.
Neste fortim que estava inutil, está hoje artilharia e assim elle como a plataforma tudo lageado com os seus telheiros pera resguardo assim da artilharia como dos soldados donde ficam oito peças cavalgadas. Tinha mais este Forte um eirado que estava cahido e entulhado, está hoje perfeitamente acabado de vigame junto, ladrilhado e com betume por cima pera resguardo da madeira.
Estas Fortalezas ficam distantes da Barra, a de S. João meya legoa pouco mais a de N. S. do Carmo na marinha desta villa em que ficava a entrada sem impedimento algum e a villa do Spirito Santo sem defença.
Mandou V. S. fundar o forte S. Francisco Xavier a entrada da Barra em sitio muito conveniente pera este effeito e de melhor segurança com o qual não hé possível poder passar embarcação sem grande risco. A forma delle hé de laranja, o diametro de 80 palmos e a circumferencia de 240, a muralha hé fortissima pois nace entre grandes penedos com doze palmos e nos mesmos continúa athé o pavimento do lageado e dahy sobe em nove de groço em dez amêas, toda a praça lageada com hum grande telheiro, e sua casa de pólvora; pode ser socorrida em qualquer conf licto e de prezente fica com oito peças cavalgadas.
Na primeira relação que dey a V. S. se vê haver somente nesta praça dezessete soldados de Infantaria, dois artilheiros e hum condestavel: hoje se contam trinta e tres soldados, seis artilheiros e o condestavel, então se socorriam aquelles poucos, apenas tinham sinco socorros pela falta de effeitos por andar a renda muy diminuta; hoje com os mais que V. S. acrescentou são mais socorridos, então não rendiam os effeitos mais que 255$000 rs. deste se tiravam os gastos da Camara com que ficava cousa muy limitada, aplicou V. S. todo o seu cuidado em acrecentar e vemos que subiu esta a perto de 400$000 rs.
Os dizimos andavam em 1:468$000 rs. com a presença de V. S. se arremataram em 1:804$000 rs. e vemos crescerem 366$000 rs.
Estava esta capitanya muita cantidade de fazenda quando V. S. veyo a ella e ao dote e pax de Hollanda 1:438$000 rs. com grande diligencia mandou V. S. por em arrecadação todo este atrazado e mandando satisfazer o que em he orsada este anno com grande pontualidade e pera que se veja o quanto V. S. obrou neste particular hé de reparar que só em quatro annos que nesta capitania assystio se remeteram por sua ordem o melhor de quatro mil cruzados. Não só a dezempenhou V. S. desta obrigação mais ainda de muitos outros particulares, como mandando com grande zelo por em arrecadação a fazenda que se devia á Misericordia da cidade de Lisboa que foram o melhor de doze mil cruzados e se se contar tudo acho que do tempo em que V. S. entrou nella athé o presente tem esta capitanya pago o melhor de 30 mil cruzados, tudo se deve piedade com que V. S. tratou o augmento della a Tinham estas villas quatro companhias de ordenanças e estas sem ordem, hoje ficam divididas em nove com boa disposição: na villa da Victoria ficam cinco, na do Spirito Santo duas na Villa Nova húa e outra que V. S. ordenou dos homens pardos, com que fazem as nove.
Este hé o estado em que V. S. deixa a capitania em tão breve tempo tão aventajada do infimo em que a achou; estava incapax de defença, hoje fortificada com três fortalezas das melhores do Estado com dezesete soldados e dois artilheiros estava esta praça, hoje fica com trinta e tres, seis artilheiros e hum condestavel. Quatro Companhias tinha somente e hoje nove; duas villas attenuadas a da Victória e do Spirito Santo, hoje redificados. A villa da Victoria com a casa da Camara concertada; os templos que estavam arruinados hoje com grande aceio estão em sua perfeição, concorrendo V. S. com sua ajuda de custo para tudo: A Villa do Spirito Santo que somente apparencias de villa tinha, mandou V. S. fazer casa da Camara que nunca teve, pelourinho, tudo de pedra e cal e tão perfeito que se não a acha villa que a tenha como ella.
A casa da Mizericordia que não se viam mais que os vestigios, mandou V. S. levantar, ficando perfeitissima, aqui mandou V. S. dar sepultura decente aos ossos do primeiro Donatario Vasco Coutinho que soterrados em húa arca ainda se conservam reliquias delles. Está hoje essa villa muito enobrecida, assim na justiça como no mais.
A Villa da Conceição que V. S. mandou edificar no rio Guarapim, consta sua fundação de trinta casáes e hoje com suas familias excedem de trezentas almas e já fica a villa perfeita com pelourinho de pedra e cal e forma de justiça por eleição que ha dois annos se continúa, com sua matrix muito fermosa de pedra e cal toda ladrilhada e paramentada ricamente, só lhe falta acabar a casa da Camera, cujos materiáes ficam dispostos pera ser da proporção da da villa do Spirito Santo.
Todas estas obras assim das fortalezas como das villas e fundação da nova hé de reparar que não concorreu pessoa algúa. Sómente concorreram os grandes dispendios com que V. S. aperfeiçoou tudo que em húa e outra cousa gastou melhor de doze mil cruzados e com maior cuidado se empregou nas jornadas á serra das Esmeraldas e não com menos dispendio, pois só nas duas entradas pelo rio Doce foram mais de doze mil cruzados e nas doze experiencias que por noticias que V. S. tinha, mandou fazer, se gastaram mais de dois e foram entradas catorze; acudindo a tudo com zelo do serviço de Deus e de S. A. não tendo hora ocioza que não fosse todas no emprego de melhorar esta capitanya e na verdade são as ações de V. S. dignas de serem imitadas. Villa da Victoria em vinte e sete de julho de 1682. O Provedor Manoel de Moraes.”
– Firmas reconhecidas pelo tabellião da villa da Victoria, Martim Damorim de Tavora e pelo Ouvidor Geral da Bahia, Dr. João Gois e Araujo.”